Quebra de padrões estéticos. Veja a matéria da Natália Rocha da Silva

Luta pela quebra de padrões estéticos leva mulheres a assumir seu jeito de ser

Por Natália Rocha

Todos querem chegar a um ideal de beleza que julgam perfeito, que para grande parte da sociedade é caracterizado por mulheres magras, de cabelos lisos e esvoaçantes, usando roupas de grifes. Porém, essa ideia está longe de ser o que acontece na realidade, já que as mulheres possuem uma grande diversidade de biotipos.

A cultura brasileira é rica em pluralidade devido à grande miscigenação e hibridação de outras culturas, que nem sempre tem seu devido valor. Assumir sua verdadeira origem nem sempre é fácil, mas lutar pela preservação de sua história e cultura é combater o preconceito que ainda existe na sociedade, seja ele oculto ou não. Por outro lado, nunca antes houve um debate tão grande sobre a valorização da beleza feminina.

Desde 1950

Um teste com crianças e duas bonecas, uma branca e outra negra foi realizado pela primeira vez em 1950, pelo psicólogo Kenneth Clark, e posteriormente em 2005, por outro norte-americano, o cineasta Kiri Davis. Ele mostra que as crianças preferem as bonecas brancas, já que consideram a boneca negra como feia, má e sem graça.

A pesquisa de 1950 entrevistou 16 crianças africanas e mostrou a preferência de 63% delas pela boneca branca. O mesmo teste realizado em 2005, com 21 crianças, não teve muita diferença: 15 jovens escolheram a boneca caucasiana como a mais bonita e a mais legal.

Mesmo com essa visão negativa, jovens e adultos estão buscando formas de transformar a situação mostrando o lado positivo, como é o caso de Cynthia Mariah, 30 anos, que comanda uma marca de roupas. Ela conta que teve dificuldade em assumir sua própria identidade. “Todo mundo alisava o cabelo, e perguntava: ‘E aí, não vai passar nada? ’”, destaca Mariah, ao relembrar a época em que resolveu assumir os cabelos cacheados.

Dispostas a fortalecer o movimento de valorização do cabelo crespo, Cynthia e muitas outras mulheres negras, que antes tinham vergonha dos fios, hoje buscam caminhos para ajudar, inclusive crianças, a não terem vergonha de serem elas mesmas.

Segundo o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010, dos mais de 190 milhões de brasileiros, 52,47% se autodenominavam negros, pardos, amarelos ou índios. Ou seja, sendo a maioria eles ainda sofrem com o preconceito.

De acordo com as pesquisas realizadas em 2015 para o Mapa da Violência, no mesmo ano do censo a taxa de homicídio de negro era igual a 38,5%, enquanto de brancos ficou em 16,2%. Os dados da análise mostram que existe disparidade entre os grupos étnicos que pode estar longe de ser resolvida.

É com o intuito de quebrar as barreiras do preconceito e diminuir os números de desigualdade que homens e mulheres criam grupos de apoio e projetos para encorajar, dar força e proteger quem quer assumir suas raízes, que para Cynthia está localizada na origem de seus ancestrais.

Thalita dos Santos Fonseca, 21 anos, é auditora de qualidade e diz que o que mais gosta em seu visual são os cabelos. Na sua opinião, junto com as roupas os cachos contribuem para manter a cultura viva e mostrar a sociedade que não existe um padrão único de beleza.

Através da internet, especialmente do uso de redes sociais como Facebook, Instagram e Youtube, pessoas com diferentes idades criam maneiras criativas de abordar assuntos como a valorização da cultura negra e o preconceito. São pessoas que falam sobre a beleza e preservação, e moldam suas ideias e conceitos para que deixem de ser considerados equívocos.

Histórias de mães que no passado sofreram com a “síndrome do embranquecimento” mostram que a pressão da família para que as mesmas alisassem seus cabelos era bem maior que hoje em dia.

Atualmente, busca-se educar, mostrar aos filhos que se aceitar é a chave para uma vida com menos sofrimento e transtornos. Meninas negras de 5 a 9 anos, por exemplo, já sabem que seus cabelos Black Power são lindos e poderosos.

Para a artista e educadora Sheyla Ferro, 38 anos, assumir a identidade é muito importante. “Afirmar minha ancestralidade é um instrumento na luta contra o preconceito e pode influenciar outras pessoas a fazerem o mesmo”, diz.

Há sinais de que esta é uma realidade que está mudando. Prova disso é o vídeo da pequena Elis Catanhede, 4 anos, gravado pela mãe, Renata Morais. Publicado no Facebook, mostra a menina falando sobre seus cabelos crespos, dizendo que não é peruca e que nasceu “pleta”! (Sic!) E é assim que quer ser vista.

Outro ponto é o reconhecimento da beleza negra como símbolo nacional. O concurso Miss Brasil 2016, surpreendeu com a quantidade de candidatas negras para coroa, com seis representantes, fato que não ocorreu em outras edições. E para uma representação ainda maior quem levou a coroa no concurso realizado no dia 1º de outubro foi a jovem paranaense Raissa Soares, uma negra que durante o desfile exibiu os cabelos “black”. Levou o prêmio.

Raissa Soares foi a segunda mulher negra a vencer o concurso. A primeira vencedora foi a gaúcha Deise Nunes, em 1986, o que prova que o Brasil, apesar de sua história com os negros, ainda tem muito a avançar na questão do domínio racial. Passaram-se 30 anos e nesse tempo apenas mulheres brancas ganharam o concurso.

E para quem pensa que cuidar de cabelos cacheados dá trabalho, muito se engana. Cynthia Mariah diz que é até mais fácil do que cuidar de um cabelo liso.

O que fica depois de tudo isso? Apenas a esperança de um dia não haver mais preconceito. Atitudes como a da mãe de Elis, mostram que num futuro próximo talvez as coisas sejam diferentes. As pessoas poderão aceitar, de uma vez por todas, umas as outras, para aprenderem juntas sobre a valorização e unir ainda mais ideias e ferramentas para construir o tão sonhado mundo livre de preconceito.

Para incrementar o estilo

Na busca por ressaltar ainda mais a sua beleza, mulheres negras vivem um dilema quando o assunto é cosméticos, pois o setor está em fase de expansão em relação a pele negra.

A pele afrodescendente possui grande diversidade, mas a quantidade de produtos não segue a mesma proporção. Inúmeras marcas possuem itens de maquiagem com tonalidades para atender as necessidades das mulheres. Entretanto, nem sempre os tons mais escuros resultam no efeito que elas desejam.

Itens como base e pó compacto, por exemplo, são produtos que mulheres negras não encontram com facilidade. Por isso, muitas vezes compram nuances diferentes daqueles da pele e chegar ao tom perfeito fazendo misturinhas em casa.

Já no setor capilar, apesar do crescimento do mercado nos últimos anos, ainda há déficit de opções de produtos para cabelos cacheados. Para cabelos afros é ainda mais complicado. Há poucos produtos adequados, o que muitas vezes influência no processo de transformação dos cabelos, já que a falta de mercadorias pode ser um dos motivos para que mulheres deixem de preservar o cabelo natural.

Mesmo com poucas opções em lojas físicas, o cenário da beleza negra está se transformando. Dicas de blogueiras e receitas caseiras mantém os cabelos bonitos.

Nossas entrevistadas entregam o que guardam em seus nécessaires:

  • Creme de Hidratação – Morte súbita – Lolla Cosméticos.
  • Finalizador de Cachos – Salon Line.
  • Mix de Óleos (Girassol, Oliva e Coco) – Salon Line. Para umectar, fazer twist e finalizar penteados.
  • Maquiagens das marcas Muene, que tem uma grande preocupação com a pele negra e tons diferentes das marcas convencionais) e Mary Kay, com produtos muito bons.
  • Filtro solar e creme hidrantes de boa qualidade.

*A foto é de Raíssa Santana, Miss Brasil 2016.

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