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Revista on-line do Curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo.

No. 3 – fev-abr / 03

sumário

  • Editorial
  • Ecos da mídia
  • Eventos
  • Na agenda
  • Uma questão de métodos
  • Resenhas & Sinopses
  • Recreio literário
  • Informe publicitário
  • VESTIBULARES
  • Expediente

DATA VENIA é a revista eletrônica do Curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo. De periodicidade trimestral, seu conteúdo não necessariamente coincidirá com o pensamento da FEBASP, mantenedora desta Instituição, mas será de inteira responsabilidade dos autores que subscreverão suas respectivas matérias.
As colunas serão alimentadas pelos professores do Curso, contando-se também com a colaboração do alunado, da Comunidade Febaspiana como um todo, e apenas marginalmente, ocorrerá a participação de colaboradores externos à Instituição.

Além de divulgar as notícias relacionadas ao Curso, as matérias publicadas reportar-se-ão às sociedades nacional e internacional, através de textos inéditos e não muito extensos, acolhendo-se também material redigido nos idiomas inglês e espanhol.

O conteúdo divulgado em DATA VENIA pautar-se-á pelo balizamento ético e pluralismo das idéias, as quais autoriza-se sua reprodução por quaisquer meios desde que se mencione suas respectivas fontes.

Editorial

Negociação ganha-perde

Como o próprio título acima sugere, uma negociação desse tipo configura o payoff para um jogo de soma zero, como aquele que ocorre no comércio internacional, assim visualizado tanto pelos nacionalistas (outrora mercantilistas) quanto pelos marxistas.

Por sua vez, os liberais vêem o comércio internacional como um jogo de soma positiva, quer dizer, promoverá ganhos mútuos para todos os seus partícipes (nem sempre na mesma proporção, é bom que se diga), estando mais próximo, portanto, de uma negociação ganha-ganha.

Por este último prisma, navega (ou naufraga) o ideário dos atuais defensores do livre comércio, cuja defesa avoluma-se em retórica, mas escasseia em termos práticos, pois a realidade denota que os países do Norte são inteiramente favoráveis à abertura dos mercados externos (países do Sul, principalmente), mas são bem menos afoitos quando se trata de abrir seus mercados domésticos.

Comportaram-se assim os norte-americanos, quando de suas propostas iniciais quanto aos montantes e respectivos prazos para reduções tarifárias, no âmbito da Alca (Área de Livre Comércio das Américas), senão vejamos os informes do USTR (corresponde ao ministério do comércio exterior norte-americano).

· 65% das exportações de bens manufaturados, procedentes dos parceiros norte-americanos, na Alca, estarão isentas de tarifas aduaneiras, enquanto 56% dos produtos agrícolas terão o mesmo tratamento;
· para os quatro parceiros do Mercosul, esses percentuais serão da ordem de 58% e 50%, respectivamente, enquanto os quinze parceiros do Caricom (Comunidade Caribenha e Mercado Comum) serão agraciados com os respectivos percentuais de 91% e 85%;
· na agricultura, especificamente, os percentuais tarifários remanescentes serão reduzidos de forma gradativa no prazo de cinco anos, exceto para produtos sensíveis (açúcar, cítricos etc.) os quais levarão dez anos ou mais para sofrerem desgravação tarifária;
· no caso de produtos têxteis e vestuário, as tarifas serão eliminadas no prazo de cinco anos, a contar da entrada em vigor da Alca, prevista para 2005 com o fim das negociações e respectivas aprovações pelo poder legislativo de cada país envolvido;
· eliminação de tarifas, quando do lançamento da Alca, para os seguintes itens: produtos químicos, ambientais, equipamentos elétricos, e médicos, e também para construção civil e engenharia, tecnologia da informação, papel, madeira, aço, além de produtos do setor energético e tecidos sintéticos.

Cumpre ressaltar que tanto esta última desgravação, quanto àquela dos têxteis e vestuário estarão condicionadas à atitude reciproca proveniente dos demais 33 parceiros norte-americanos na Alca.

Devemos atentar para os aspectos não quantitativos, mas qualitativos da proposta apresentada pelos norte-americanos, uma vez que a redução tarifária não elimina assimetrias competitivas, nem tampouco reduz disparidades tecnológicas entre parceiros comerciais. Aliás, o comércio internacional jamais será totalmente livre justamente devido às referidas assimetrias.

Já o acesso a mercados externos, de modo sustentado e duradouro, requer capacidade competitiva em preço, qualidade e regularidade no fornecimento. Além disso, requer ainda que se não forem eliminadas, ao menos sejam amplamente reduzidas as barreiras não tarifárias, que por serem menos visíveis que as tarifárias, muitas vezes até as substituem, eliminando assim, o efeito redutor em seus níveis percentuais. O GATT, desde sua criação (1947), logrou considerável êxito na redução gradativa de barreiras tarifárias, ao menos em média e principalmente com a Rodada Kennedy (1964/67) e Rodada Tóquio (1973/79) [rounds de negociações multilaterais de comércio, a exemplo da Rodada Uruguai, a mais longa dentre as oito realizadas até o presente momento, 1986/94], mas o mesmo não se pode dizer das barreiras não tarifárias como quotas às importações, medidas antidumping, subsídios e aquelas de natureza fitossanitárias etc. Barreias estas praticadas em grande medida pela tríade EUA, União Européia e Japão.

Como toda negociação se define por um processo e não por um fato consumado, com a Alca não poderia ser diferente e assim, compreende-se que a decolagem do processo seja tímida, passando a uma maior agressividade (espera-se) com o decorrer das negociações. Processo aliás que exige paciência, capacidade negociadora e muito jogo de cintura entre as partes demandantes.

Por conta dessa paciência, mesmo sofrendo discriminação dos norte-americamos na Alca, a julgar pelos dados acima, os países do Mercosul e em especial o Brasil, precisam lutar pela preservação da parceria comercial com os ianques, afinal, trata-se de um grande mercado não apenas em extensão, bem como, em poder aquisitivo. É preciso ter em mente que a troca de parceiros comerciais não se reduz a uma decisão política, nem se faz abruptamente. Até porque (1) os contratos precisam ser respeitados; (2) via de regra os parceiros comerciais são agentes privados; (3) acessar novos mercados às vezes significa ter de deslocar competidores já instalados, daí a importância daquele tripé competitivo: preço, qualidade e regularidade na oferta; (4) a troca de um mercado por outro não ocorre de modo simultâneo; e, (5) a troca de um mercado por outro poderá ser um caminho sem volta.

Os países do Mercosul (Brasil principalmente), com efeito, precisam intensificar e consolidar o comércio no âmbito de sua união aduaneira, além de conquistar novos mercados, mas para tanto, não é necessário dizer adeus aos parceiros comerciais do presente. A troca dos antigos pelos novos, nesse caso, pode não configurar a troca de seis por meia dúzia simplesmente.

Ainda é cedo para se falar de negociação ganha-perde, visto que as negociações em torno da Alca estão apenas em sua fase inicial. Os norte-americanos, convenhamos, precisam mais da Alca do que os demais 33 integrantes, por se tratar de um mercado maduro, face ao estágio de desenvolvimento que aquela sociedade já atingiu e, portanto, com menores espaços para o crescimento. Assim, é de se esperar novas e melhores ofertas, e até mesmo contra-ofertas provenientes do vizinho do Norte. Este, diga-se de passagem, protege algumas de suas indústrias maduras e isso “autoriza” a que o Mercosul também proteja sua indústria infante. O fato é que negociar é preciso; impera envidar esforços para se atingir um payoff ganha-ganha, a fim de que tenhamos senão um comércio mais livre que o atual, ao menos alcancemos um comércio mais justo (fair trade).

Raimundo Ferreira de Vasconcelos

Caminhos da humanidade...

Os Riscos da Nova Ordem Mundial

Se chegamos a pensar, por um momento sequer, que a queda do Muro de Berlim e o colapso da União Soviética e do Leste Europeu poderiam afastar em definitivo do horizonte da História, o risco da guerra e conflitos de grande porte, os fatos que agora tomam a forma de preocupantes manchetes, nos jornais do mundo inteiro, vêm desmentir aquela vã esperança. Uma Pax Americana foi o que de fato se impôs ao mundo e um revival do totalitarismo parece tomar forma cada vez mais clara e assustadora: um totalitarismo travestido de globalismo, apoiado num pensamento que se quer único e que submete os direitos sociais à razão competitiva e aos ditames do mercado, esse novo deus a que se presta agora incondicional reverência e tributo.

“O fim da Guerra Fria, – observa Pablo Casanova – não acabou com o perigo mundial. Desde 1990, com a desintegração da URSS e a proliferação das autoridades militares em suas antigas repúblicas, aumentou o perigo de difusão de tecnologias nucleares, o que já se havia constatado em países como Israel, África do Sul, Iraque ou Coréia do Norte, entre outros.” (1)

Não foram poucos aqueles que, por oportunismo alguns, por insensatez, outros, apressaram-se em renegar todo um passado de lutas, derrogar insígnias, atestando o óbito do socialismo e proclamando a vitória final do capitalismo. Não faltou sequer quem decretasse o fim da História ou quem desqualificasse qualquer crítica ao processo que então se desencadeou de forma agressiva.

Foi preciso menos de um quarto de século para dissipar aquelas expectativas de paz e hoje, em meio à exclusão, à regiões inteiras do globo que sobrevivem na mais profunda miséria, o espectro da guerra se insinua no cenário internacional de forma ameaçadora e o grande capital e uma rede insidiosa de interesses lançam seus poderosos tentáculos um pouco por toda parte. A transnacionalização joga uma pá de cal sobre a rede de proteção social que se forjara no bojo de intensas lutas sociais – desde o século XIX e ao longo do século XX – e não foram poucos os que sucumbiram à miragem do Estado minimal.

Toynbee, com seu otimismo cético e desesperançado, ao analisar nos quadros da Guerra Fria, a possibilidade de uma guerra terminal, varrendo os sinais de vida da Mãe-Terra e a degradação progressiva do meio ambiente, que já se lhe configurava um verdadeiro ecocídio, afirmava que o homem cometeria ainda muitos erros e o poder que rege o planeta e se assenhora da História continuaria envolvendo milhões de pessoas em guerras fratricidas, pondo em risco a própria sobrevivência da Humanidade. Deixava aberto, entretanto, um portal de esperança, julgando que no final, o instinto de sobrevivência falaria mais alto e teriam os homens que por termo a essa escalada de terror que a guerra engendra e começar a contabilizar as perdas – algumas muito difíceis, outras até impossíveis de recuperar – e reconstruir um mundo, fazê-lo renascer das cinzas.

As vozes saudavelmente discrepantes que se fizeram ouvir no Fórum Social realizado em Porto Alegre, onde ao longo de uma semana, mais de 20 mil delegados se reuniram, representando mais de 700 organizações e 156 países, vem romper – movidas pelas mesmas preocupações – com um discurso homologatório e servil que procurava fazer tábula rasa do passado e sucumbia ao encanto do neoliberalismo. E vozes bastante persuasivas como a de István Mésàros, não recearam recolocar o socialismo – que se imaginara morto – como opção para a barbárie que hoje ameaça o mundo sob as mais variadas formas e, dada a ubiqüidade da crise que se abate sobre nós, não poupando sequer a vida cotidiana, roubando-nos o trabalho ou aviltando-o de modo tal que se torna insuportável, privando do pão de cada dia, um grande número de mesas e bocas famintas e povoando de sombras nosso amanhã.

O velho socialismo, denominado real, burocratizado e diverso em tudo da esperança que suscitara um dia, num já remoto outubro, teve de morrer, depois de lenta agonia e sinais de degeneração de que teriam sido expressão a Revolta da Hungria (1956) e a Primavera de Praga (1968), para que um novo socialismo pudesse renascer penosamente e encontrar abrigo em mentes e corações.

É possível perceber nos ecos de Porto Alegre, que se reproduzem um pouco por toda parte, que aumenta em intensidade e vigor o clamor contra o mundo intolerável, ameaçado por suas desigualdades e desperdícios e por um individualismo destruidor, que colocam em questão as próprias premissas do liberalismo, como tão bem acentuou René Dumont, no diagnóstico a que deu forma e conteúdo na obra “Um Mundo Intolerável”.(2)

Foi possível, outrossim, perceber o quanto são poderosas as vozes que se reúnem e que mais poderosas ainda serão na medida em que se multiplicarem, fortalecendo a luta por uma democracia de participação ampliada, criando novas formas de intervenção política e sem omitir sequer a revolução como possibilidade histórica e a resistência, a insurgência pacífica capaz de anelar muitas vontades dispersas nas lutas de cada dia, mas sobretudo sensibilizando as consciências e atuando positivamente em diferentes níveis. É possível assim começar a reverter as tendências suicidas para o belicismo e a auto-destruição, assim como o quadro de miséria e exclusão social que o sistema econômico vigente configurou.

E sequer Davos, onde se reuniu o Fórum Econômico Mundial, terá ficado imune por inteiro ao vigor dessas vozes e teve de se render às evidências de que um outro mundo é possível; um outro tipo de relação entre os povos é desejável e necessário; que a sociedade não pode resultar apenas de uma equação econômica, que o abandono dos objetivos sociais não pode ser o preço que se paga pelo crescimento econômico, que a luta por uma sociedade mais justa deve considerar o valor da natureza, do povo e da cultura e que a liberdade não pode ser sacrificada no altar da tecnologia ou do poder econômico ou ainda sujeitar-se aos ditames do mercado.

Não podemos ter certeza de que essas vozes – entre elas a do presidente brasileiro, que se fez presente nos dois eventos – tenham logrado se internalizar nos participantes de Davos ou se resultarão numa efetiva mudança no modo de ser, pensar e agir, capaz de repercutir nas relações entre classes, entre as regiões de um mesmo país, entre os povos e nações de todos os continentes. Resta esperar por atos concretos que sinalizem essas mudanças e tomadas de consciência, explicitando-as por inteiro.

De outra parte, resta saber como e até quando o novo governo brasileiro poderá conciliar a correção de rumos para a qual acenou, ainda que cercado de cuidados, pisando entre ovos e cristais, ao longo da campanha eleitoral, com as recomendações do Fundo Monetário Internacional e dos interesses representados em Davos. Logrará o novo governo, que assumiu cercado de esperanças, manter as premissas de uma política econômica clássica e atender às demandas sociais? Poderá o novo governo evitar rupturas sem arcar com os desapontamentos, alguns dos quais já se manifestam em sua própria seara? Ou conseguirá romper com o modelo econômico que permanece intocado, sem suscetibilizar o mercado e elevar o risco Brasil? Poderá uma voz altiva no procênio internacional casar-se com uma atitude tímida e subalterna no plano interno? Logrará ainda amortecer os descontentamentos com a execução de projetos sociais cuja eficácia deve ser demonstrada e cuja mística não é perene?

As forças e as vontades mobilizadoras comprometidas com um novo projeto não podem entretanto confinar suas lutas no plano nacional, devem sobretudo, repor a luta no plano em que ela realmente se trava, quer dizer, na arena internacional, articulando-a com as lutas locais e sem olvidar as especificidades de cada sociedade e a imensa dívida social que temos para com aqueles que perderam o barco da grande sociedade. Significa, sobretudo, rever os princípios que regem as relações internacionais e os pressupostos nos quais se escoram os Estados e seus agentes, para garantir suas vantagens. E mais, significa não esmorecer na vigília, no acompanhamento crítico das propostas de reforma ainda bastante desarticuladas, afinal a luta por uma sociedade de novo tipo e por um novo modelo econômico não começa em Davos e muito menos deve terminar em Porto Alegre.

Fica a impressão de que uma guinada em outras direções, e a necessidade de uma vigorosa correção de rumos encontra guarida nas consciências, afinal não se tem notícia de uma sociedade justa que tenha tido por fundamento o mercado e o individualismo exacerbado. Um novo ordenamento político deve estancar a sangria a que são submetidos os países mais pobres e por fim a um processo que resultou numa forma de domínio imperial sobre todos os continentes, capitaneado por empresas monopolistas multinacionais e transnacionais, que agem sob a sombra e cumplicidade de múltiplas bandeiras. Enfim, algo muito diferente daquele governo mundial que o espírito nobre e generoso de Arnold Toynbee um dia sonhou e que deveria promover a paz, eliminar a guerra dos horizontes da História, planejar a produção e distribuição de alimentos, colocar as conquistas da ciência – e não apenas os riscos – ao alcance de todos, reduzir as discrepâncias sociais e por termo a todas as formas de autoritarismo. (3)

Notas
1. CASANOVA, Pablo Gonzales – [1995] – O COLONIALISMO GLOBAL E A DEMOCRACIA. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.
2. DUMONT, René – [1989] – UM MUNDO INTOLERÁVEL. O LIBERALISMO EM QUESTÃO. Rio de Janeiro: Revan.
3. TOYNBEE, Arnold – [1970] – EXPERIÊNCIAS. Petrópolis (RJ): Vozes.

Evaristo Giovannetti Netto
Doutor e mestre em História Social. Professor do curso de Relações Internacionais
do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo.

Ecos da mídia

“O glamour de uma profissão”

Este foi o título da matéria publicada pelo Jornal paulistano Gazeta Mercantil, de 3 a 5/03/03, assinada pela jornalista Maria Helena Tachinardi, e versou sobre a profissão (não regulamentada) de internacionalista. O destaque ficou por conta da elevação da empregabilidade, no Brasil, de profissionais de relações internacionais. Vejamos um briefing da citada matéria.

Até há bem pouco, a política internacional era tratada por militares da Escola Superior de Guerra (ESG) e por diplomatas.
Hoje os especialistas procurados pela imprensa para explicar os acontecimentos saíram de cursos de graduação, mestrado e doutorado em relações internacionais, espalhados pelo Brasil.
Além do Congresso Nacional, as organizações não-governamentais (ONGs), as câmaras de comércio e indústria estrangeiras [Amcham, e.g.], o alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (acnur), escritórios de advocacia, federações estaduais de indústria, bancos, empresas e jornais são segmentos do mercado que absorvem os formandos em relações internacionais, seja em programas de estágio ou para ocupar cargos efetivos.
Apesar da absorção cada vez maior do profissional de relações internacionais, o mercado o conhece relativamente pouco. Ele tem uma formação que lhe permite entender as crises internacionais, trabalhar com negociações comerciais, lidar com o mercado de investimentos, analisar a conjuntura interna [e externa] e fornecer estudos sobre o Brasil para empresas multinacionais.

A matéria termina por ratificar uma certa antigüidade para os cursos de relações internacionais, em países como Argentina e Chile, comparativamente aos cursos recém-criados no Brasil, não sem antes salientar a ausência de estudos temáticos e regionais, a exceção apenas do Mercosul.

Em adição à matéria supra, cumpre acrescentar que o curso de relações internacionais da FEBASP, mantenedora do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, constitui-se num dos melhores cursos dentre os mais recentes que foram criados nessa área, no Brasil. Focado na Geopolítica, nosso curso norteia-se por três eixos temáticos: Política Internacional (negociação); Integração Regional (Mercosul, Alca, União Européia etc.); e, Teoria das Relações Internacionais (acordos, convenções e tratados internacionais), os quais estarão ainda ancorados numa forte carga de pesquisa.

Eventos

Aula Magna

“expectativas e possibilidades da política externa brasileira e inserção internacional do Brasil no governo Lula da Silva”.

Este foi o tema da aula inaugural do curso de Relações Internacionais da FEBASP, proferida em 05/02/03 – a partir de 20h00 – no auditório Prof. Raphael Galvez Dazanni, do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo.

Palestrante: Prof. Dr. Christian Lohbauer – Doutor e mestre em Ciência Política pela USP; Gerente de relações internacionais da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

Na agenda

ENERI 2003

O Encontro Nacional dos Estudantes de Relações Internacionais deste ano, ocorrerá na cidade paulista de Ribeirão Preto, e será sediado pelo Centro Universitário Moura Lacerda.

“Relações Internacionais, Economia global e Cidadania” será o tema sobre o qual se debruçarão os debates no referido encontro.

Simultaneamente, ocorrerá o I Encontro Nacional de Empresas Juniores de Relações Internacionais – ENEJ RI.

Para maiores informações sobre o evento: eneri-rp@yahoo.com.br

Uma questão de métodos

Ciência e arte: por uma metodologia científica crítica e criativa

O campo da Metodologia Científica ainda tem sido considerado por muitos um terreno árido na vida acadêmica de nossos estudantes. A palavra “método” significa “caminho para”, e nesse sentido, a metodologia científica é um ramo de conhecimento que visa facilitar o acesso e o processo de se fazer ciência. São duas as principais abordagens desta disciplina: a primeira é teórica, através da compreensão crítica das linhas teórico-metodológicas da produção científica, adentrando no campo da Sociologia do Conhecimento; a segunda é prática e tem como preocupação central o levantamento de técnicas de pesquisa que melhor auxiliem e componham uma produção científica de qualidade.

O argumento central deste breve artigo é que os motivos que tornam a Metodologia Científica tão pouco “atraente” aos nossos alunos dizem respeito à própria concepção que temos não só desta disciplina, como da própria ciência. A partir da revisão destes conceitos, salienta-se a necessidade de se superar tanto a visão empirista e positivista, quanto a visão tecnicista que tem permeado o campo da Metodologia Científica. Por fim, propõe-se uma abordagem alternativa, que integre tanto aspectos racionais e objetivos, quanto categorias de ordens mais subjetivas, como a arte e a dimensão estética, vislumbrando, portanto, uma produção científica ao mesmo tempo mais crítica e criativa.

Em primeiro lugar, falar em abordagens teóricas no campo da Metodologia significa desenvolver de forma angular a capacidade crítica de nossos alunos, iniciá-los nos caminhos da ciência, fazê-los entender, interpretar e problematizar as teorias que estudam. Mas, como fazer isso com uma concepção de ciência tão distante da realidade destes jovens? Por muito tempo, a força de uma ciência positiva e estritamente empirista, pretensamente capaz de formular verdades absolutas e inquestionáveis sobre a realidade, foi predominante e, digamos, pouco significativa aos estudantes em geral. Ernst Fischer afirma que tanto a ciência como a arte servem para integrar o indivíduo ao seu mundo exterior, em sua busca por significação. Vejamos esse pequeno trecho:

(o homem) “busca um mundo mais compreensível e mais justo, um mundo que tenha significação. (…) O homem anseia por estender o mundo circundante, integrá-lo a si; anseia por estender pela ciência e pela tecnologia o seu “Eu” curioso e faminto de mundo até as mais remotas constelações e até os mais profundos segredos do átomo; anseia por unir na arte (1) o seu “Eu” limitado com uma existência humana coletiva e por tornar social a sua individualidade.” (Fischer, 1966, p. 16-7)

Nesse sentido, é possível que o conhecimento científico comece a despertar algum interesse em nossos estudantes quando aquela concepção fria e distante de ciência for substituída por outra mais contextualizada e comprometida com a cultura e com a história de cada lugar, tendo em vista atender à necessidade básica do ser humano de se relacionar, de estender-se em direção ao outro, de buscar, portanto, tanto a sua felicidade, quanto o bem da sociedade em que vive.

Esta primeira idéia desencadeia uma segunda proposição bastante comum nos meios não acadêmicos, a idéia de que ciência é coisa para “especialistas”, super-homens e supermulheres dotados de uma capacidade extraordinária de “fazer ciência”. Este é um dos mitos que mais atrapalha o despertar de nossos alunos para os desafios e os prazeres que o conhecimento científico pode trazer, uma vez que se vêem intimidados pela idéia de que ciência “é coisa para intelectuais”, e em última análise, “é coisa para loucos”. A ciência é colocada, assim, como algo absolutamente hermético e inacessível para os “pobres mortais”. Ora, nada mais longe da verdade.

Outra dificuldade em relação à disciplina de Metodologia é propriamente sua abordagem mais prática, o conjunto de regras e técnicas de pesquisa que, se por um lado, pode facilitar bastante a vida de estudantes e pesquisadores, por outro, pode tornar-se uma camisa de força. Isso porque no afã de introduzir nosso aluno na iniciação científica, muitas vezes corremos o risco de apenas tê-lo “formatado”, ou como sugere Pedro Demo (1995), ter formado um “idiota especializado”, ou seja, aquele que segue à risca todas as regras metodológicas, mas é incapaz de fornecer uma contribuição original e crítica à sociedade em que está inserido.

Assim, concordamos com Elisabete Pádua, no sentido de que os procedimentos e as técnicas servem apenas como “suporte ao desenvolvimento do processo de pesquisar, constituem-se como meios, através dos quais poderemos implementar nosso projeto de desenvolvimento de uma formação intelectual rigorosa, crítica e sintonizada com nosso tempo” (Pádua, 2000, p. 12). E mais, ao expor os procedimentos metodológicos desenvolvidos ao longo de sua pesquisa, o pesquisador fornece um “roteiro” de seu caminho percorrido, abrindo a todas as pessoas que se interessarem, o acesso ao mesmo conhecimento. Portanto, ao contrário de criar para a ciência uma redoma de vidro, domínio apenas de especialistas e “iniciados”, cujo fim é a aplicação rigorosa de suas regras, a metodologia pode ser instrumento de acesso ao conhecimento científico. Trata-se de aproveitar o conjunto de técnicas que a metodologia pode fornecer, como um eficiente meio na condução e produção de pesquisas de reconhecido valor científico.

Ao mesmo tempo, é essencial enfatizar a idéia de Fischer, citada acima, de que o ser humano não vive somente “dentro das possibilidades transitórias e limitadas da sua exclusiva personalidade” (Fischer, 1966, p. 16). Significa, portanto, assumir que a condição humana não se completa em si mesma, mas está sempre em busca da satisfação da necessidade de se relacionar, se comunicar, se dirigir ao outro. E a ciência, como produção humana, não vive à mercê desta realidade, não pode se colocar como um “mundo à parte”, neutro e objetivo. Esta dimensão subjetiva da vida humana deve servir como uma força alternativa em direção a uma ciência mais criativa e crítica. Pedro Demo, em sua tentativa de defender categorias mais “libertadoras” para a produção científica, como “a fantasia, parceira da utopia, a arte e a dimensão estética” (Demo, 1995, p. 64), faz referência a uma idéia de Bachelard:

“Numa admirável fórmula, Bachelard disse um dia que ‘nós temos o poder de acordar as fontes’. Ora, encontra-se no coração mesmo do homem uma fonte que não se esgota nunca, que não precisa ser acordada e é a fonte mesma daquilo a que a filosofia durante muito tempo rendeu homenagens, ao sono do corpo e do espírito, a fonte dos sonhos, das imagens, das ilusões. É a permanência deste poder originário, literalmente poético, que constrange a razão a seu esforço permanente de denegação, de crítica, de redução.” (Id. ib., p. 65).

A experiência de manter acordadas nossas fontes alimenta-se de um ingrediente que muitas vezes não faz parte de nosso currículo escolar: a criatividade. E a arte é o combustível essencial para alimentar novas idéias, soluções e o sonho de uma sociedade mais humana e justa. Aliás, Fischer é quem defende a idéia de que “a arte é necessária para que o homem se torne capaz de conhecer e mudar o mundo.” (Fischer, 1996, p. 23). Se assim for, não mais se considera a arte e a ciência como áreas distintas e inconciliáveis, mas compreende-se que uma integra a outra, num esforço comum de ler a realidade com olhos críticos, capaz de propor soluções para seus problemas, envolvendo-se com ela de forma profunda e radical, ou seja, para além da superficialidade, dos modelos prontos e das aparências. De forma muito simplificada, podemos dizer que a crítica radical pressupõe o elemento criativo, contextualizado com os processos históricos, sim, mas sensível aos elementos da intersubjetividade do fazer ciência. Mas, afinal, este talvez seja assunto para um próximo artigo. E para “colocar mais lenha” nesta discussão, transcrevo uma outra consideração de Pedro Demo, polêmica com certeza, mas que nos traz uma sugestiva alternativa aos conceitos tradicionais de ciência racional:

“A irracionalidade nem sempre é um lapso, mas o lado criativo da razão, quando aparece como poesia, como arte, como invenção, como revolução. Assim, ciência racional não é aquela que resseca o espírito, porque quer o homem como ator fora de cena; ao contrário, é aquela capaz de ver a forma, mas sobretudo de querer a felicidade histórica da sociedade, a cujo serviço deve estar a ciência. Ciência também como poesia, arte, felicidade.” (Demo, 1995, p. 65-6).

Para terminar, deixo-os na companhia dos poetas, com sua beleza e sublimidade, um trecho de uma crônica de Rubem Alves, filósofo, escritor e psicanalista, no qual o autor cita um poema de Cecília Meireles e, em seguida, também uma frase de Bachelard:

“No mistério do Sem-Fim,
equilibra-se um planeta.
E, no planeta, um jardim,
e, no jardim, um canteiro:
no canteiro, uma violeta,
e, sobre ela, o dia inteiro,
entre o planeta e o Sem-Fim,
a asa de uma borboleta.
Metáfora: somos a borboleta. Nosso mundo, destino, um jardim. Resumo de uma utopia. (…) nas palavras de Bachelard: ‘O universo tem, para além de todas as misérias, um destino de felicidade. O homem deve reencontrar o Paraíso.’ ” (Alves, 2002, p. 70-1)

Nota:
(1). Este e os demais grifos das citações são meus.

Referências Bibliográficas

ALVES, Rubem. O retorno eterno. 22. ed. Campinas: Papirus, 2002.

DEMO, Pedro. Metodologia científica em ciências sociais. 3. ed. revista e ampliada. São Paulo: Atlas, 1995.

FISCHER, Ernst. A função da arte. In: VELHO, Gilberto (org.). Sociologia da Arte. Rio de Janeiro: Zahar, 1966. p. 15-23.

PÁDUA, Elisabete Matallo Marchesini de. Metodologia de pesquisa: abordagem teórico-prática. 6. ed. rev. e ampl. Campinas: Papirus, 2000.

Crislaine Valéria de Toledo Francisco
Mestre em Sociologia. Professora dos cursos de Relações Internacionais e
Administração do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo

Resenhas & Sinopses

Queda do Império Americano

Ironicamente, quando os apologistas da ordem imperial anunciavam aos quatros ventos que, com a ruína da União Soviética, instaurar-se-ia uma “nova ordem mundial” sob domínio absoluto dos Estados Unidos, começaram a vir à tona, a partir de então, os primeiros sintomas da ruína do próprio império americano.

Sua decadência teve inicio no começo da década de 70, quando o então presidente Nixon, reconhecendo que os EUA já não tinham condições de manter a paridade e a livre-conversibilidade do dólar, iniciou o processo de desvalorização dessa moeda, realizando o maior calote de todos os tempos e enterrando de vez a ordem monetária internacional estabelecida em Bretton Woods. Foi essa a resposta do governo norte-americano ao déficit crônico na sua balança comercial, que havia esvaziado as reservas em ouro do Tesouro e cuja raiz havia sido a perda de competitividade da economia dos EUA frente às economias alemã e japonesa. O império havia começado a desabar.

Logo após, a partir de 1973, a economia norte-americana mergulharia em profunda recessão, e daí em diante se arrastaria numa estagnação crônica, da qual, apesar de todos os esforços, não logrou sair até os dias de hoje. De 1973 a 1993, a taxa anual de crescimento do PIB esteve em torno de 1%. De 1993 em diante, até meados do ano 2000, difundiu-se mundo afora a ilusão de que os EUA teriam dado a volta por cima e estariam vivendo um novo “milagre econômico”, pois sua economia estaria crescendo a um ritmo de 3% ao ano.

Na verdade, nem esse medíocre “crescimento” chegou a ocorrer. Como demonstramos em nosso último livro (“Ascensão e Queda do Império Americano”), ele foi inflado artificialmente por critérios de medição que embutem a especulação financeira e deixam de descontar parte da infração.

Essa avaliação foi inteiramente confirmada por uma revisão posterior das estatísticas oficiais promovida pelo Federal Reserve, o banco central dos EUA. Comentando essa revisão, o articulista Floyd Norris, do “The New York Times”, declarou: “após uma revisão, as estatísticas da produção industrial foram seriamente reduzidas”. Reforçando essa avaliação, o estrategista-chefe da arapuca especulativa Fuji Futures, John Vail, comentou: “Os novos números mostram que a produção industrial foi superestimada de maneira dramática”.

O escândalo das fraudes contábeis das corporações norte-americanas, que veio à tona no ano 2002, também veio reafirmar que o PIB dos EUA havia sido artificialmente inflado.

Portanto, a economia real norte-americano seguiu estagnada durante o período do “milagre”. O que cresceu, brutalmente, foi a especulação financeira – entre 1994 e janeiro de 2000, o índice Dow Jones da Bolsa de Nova York inchou sete vezes mais do que o já artificialmente inflado “crescimento” do PIB. E, para agravar, a partir de meados do ano 2000, essa economia começou a rumar em direção a uma forte depressão. O desabamento nas bolsas começou em março de 2000, a recessão na indústria deflagrou-se em agosto e os lucros das empresas começaram a cair no último trimestre daquele ano; os investimentos empresariais despencaram desde o começo de 2001 e o conjunto da economia entrou em rota recessiva desde março de 2002.

A situação está tão dramática que, apesar de um forte programa de estímulos fiscais e monetários deflagrado por George W.Bush, empurrando para um nível abaixo de zero a taxa real básica de juros, que caiu para o menor nível nos últimos 40 anos, e implementando um programa de devolução de impostos da ordem de US$ 1.35 trilhão (agora reforçado por um outro de US$ 650 bilhões), a economia prossegue se deteriorando.

As duas tentativas anteriores de injetar sangue na veia do vampiro para levantá-lo do caixão fracassaram redondamente. Primeiro, foi a reaganomics na década e 80. Reduziram-se os impostos e aumentaram-se os gastos públicos – principalmente os militares – como forma de injetar dinheiro na economia e assim reanimá-la. Ao mesmo tempo, elevaram-se as taxas de juros a fim de atrair capitais externos para financiar o déficit público que se originaria daquela política. O crescimento da demanda aliviou um pouco a economia, mas a principal consequência dessa política foi o surgimento do déficit nas contas públicas, que, ao se somar ao déficit externo crônico, provocou um festival de endividamento externo e interno e uma farra especulativa inédita na historia do país.

Com essa política, o império americano sorveu os capitais do mundo inteiro, provocando a devastação econômica do resto do planeta, mas, mesmo assim, não conseguiu levanta-se. Reagan entregou a economia em recessão ao seu sucessor, George Bush. Este [o Bush pai] inaugurou e Clinton implementou uma nova tentativa de ressurreição da moribunda economia norte-americana, mas, mais uma vez, fadada ao fracasso. Sob as alcunhas de “nova ordem mundial”, “Consenso de Washington” ou “neoliberalismo”, impuseram aos países mais débeis um conjunto de politicas que visavam, entre outras coisas, abrir espaço para as mercadorias e capitais norte-americanos. Os xerifes dessa política foram o FMI e o Banco Mundial

Apesar de multiplicarem por quatro suas exportações ao longo da década de 90, não lograram levantar-se. Esse aumento brutal das exportações não conseguiu tirar o país da estagnação econômica – ao contrário, ela mergulhou em profunda recessão a partir de meados do ano 2000. E os déficits externos, em lugar de diminuírem, cresceram vertiginosamente: de 1997 a 2000, o déficit em conta corrente do Balanço de Pagamento saltou de US$ 143,5 bilhões para US$ 435 bilhões.

Depois de três décadas de crescentes déficits externo e interno e de violento processo de endividamento [também externo e interno], a economia do império, em verdadeiro processo de apodrecimento, atingiu um grau de vulnerabilidade jamais alcançada por qualquer outro império. Seu passivo externo, isto é, o volume dos capitais estrangeiros existentes no país, já atingia em 2000, a gigantesca cifra de US$6.5 trilhões, fazendo que os EUA enviem para fora mais juros e lucros do que recebem; sua dívida pública já era então de US$5.6 trilhões e seu déficit público, que havia artificialmente desaparecido nos últimos três anos do governo Clinton, ressurgiu novamente graças à política de aumento de gastos e corte de impostos do governo Bush; o endividamento das empresas, como percentagem de seu património líquido, aumentou de 70%, em 1997, para inéditos 83%, em 2000; a divida total das famílias aumentou de 70% de sua renda disponível, nos anos 80, para mais de 100%, no inicio de 2002.

Apesar de explorar predatoriamente as riquezas, os mercados e a força de trabalho do mundo inteiro, o império americano ainda teve de endividar-se de maneira brutal para tentar evitar o seu colapso e nem assim conseguiu levantar-se. Ao contrário, à moda das frágeis economias dependentes do Terceiro Mundo, passou a depender umbilicalmente dos capitais especulativos externos para financiar seus rombos externo e interno. Tal nível de vulnerabilidade nunca atingiu qualquer império, mesmo em sua fase terminal.

Na raiz desse processo, está a perda na corrida tecnológica. Esgotaram-se as inovações tecnológicas do pós-guerra e as novas tecnologias são impedidas de massificar-se em face do controle sobre a economia, particularmente por parte do capital especulativo–financeiro.

Na economia, o império americano é, portanto, um império terminal. E, na área “social”, como isso se manifesta? Segundo estudo de um desses economistas de carteirinha do establishment americano, o professor do MIT Lester Thurow, se somarmos os desempregados à procura de emprego mais os que desistiram de procura-lo e mais os que, a contragosto, trabalham como temporários, falta emprego para 14% da força de trabalho norte–americana – cerca de três vezes maior que o índice oficial. E, se considerarmos os grupos que não têm trabalho constante, o exército de desempregados e subempregados sobe a 28% – quase um terço da força de trabalho norte-americana.

Por sua vez, dois terços dos 43 milhões de trabalhadores norte-americanos que perderam o emprego, entre 1979 e 1995, voltaram a trabalhar, mas tiveram de aceitar salários e condições de trabalho piores. Ao final dos anos 90, uma família norte-americana trabalhava por ano, em média, 185 horas a mais do que no começo da década, levando a que a jornada de trabalho comum nos EUA subisse para 60 horas por semana. A gigante Caterpillar vem impondo jornadas diárias de trabalho de até 12 horas, incluindo os fins de semana.

Desemprego, trabalho mais intensivo e, portanto, extenuante e maior jornada de trabalho, acompanhados de salários mais baixos, resultantes da queda dos direitos trabalhistas – é esse o drama dos trabalhadores norte-americanos nessa fase terminal do império. A oligarquia imperial extrai não apenas o suor, mas o sangue e a própria carne do trabalhador de seu país.

E, quando mais se aproxima seu fim, mais o império se torna agressivo na tentativa vã de evitar a dèbácle. É por isso que busca apropriar-se do património nacional dos demais países, monopolizar seus mercados e explorar desenfreadamente e de forma predatória a força de trabalho e os recursos naturais do planeta. É por isso que tenta enquadrar os demais países, e aqueles que não se submetem são agredidos militarmente ou bloqueados. Mas, quanto mais agressiva se torna essa casta imperial, mais aumenta seu isolamento no mundo.

Ao lado das lutas e revoluções que explodem em todos os rincões do planeta, e das manifestações anti-”globalização” que tornaram impossíveis as reuniões dos representantes das finanças mundiais em qualquer parte do mundo, os EUA foram excluídos, em março de 2002, de duas importantes comissões da ONU (Direitos Humanos e Narcóticos); saíram sozinhos do Protocolo de Kyoto e só não abandonaram solitários a Conferencia da ONU contra o Racismo porque foram acompanhados pelos representantes do governo de Israel. Esse isolamento só ocorre com um império moribundo.

Foi esse quadro de degeneração econômica, social e política que a casta imperial americana exibiu ao mundo, sem o menor pudor, como nunca fizera antes, a farsa em que se converteu sua já castrada democracia formal. O candidato menos votado tanto no voto popular quanto, inclusive, no colégio eleitoral, que é onde se “elege” o presidente nessa democracia de fachada, foi o escolhido para governar o país, num golpe de mão da Suprema Corte, que impediu a recontagem dos votos na Flórida, cujo resultado definiria a maioria no colégio eleitoral. Recontagem posterior feita por um “pool” de órgãos de imprensa revelou que nesse estado o presidente escolhido, George W. Bush, perdeu no voto popular e, portanto, não teria direito aos seus delegados no colégio eleitoral.

Faliu o que restava de arremedo de instituições democráticas no império. E chegaram a isso porque necessitavam impor na presidência alguém que não tivesse qualquer veleidade de impor seu próprio pensamento, a exemplo de Bush II. Num império apodrecido, a casta imperial tem pressa em saciar sua ganância para, à moda dos vampiros, permanecer na condição de morto-vivo. E por isso não pode submeter-se às mínimas regras da democracia formal por ela mesma impostas. A ditadura sem rebuços é a sua forma de governar nessa sua fase senil.
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Em suma, o império norte-americano faliu. A maneira como essa falência se converterá em colapso não é fácil prever. De qualquer forma, haverá uma combinação de crises, lutas de resistência, revoluções, avançando ou recuando ora num lugar ora noutro, mas, assim como a Humanidade encontrou um caminho para superar o escravista Império Romano e o medievalismo feudal, também encontrará o caminho agora.

Encontrará um novo modo de vida que, certamente, incorporará valores que acumulou ao longo de sua historia: o humanismo, a solidariedade, a independência, a democracia e a justiça social. E, assim, se começará a construir a verdadeira história humana.

Nilson Araújo de Souza
Doutor em Economia pela Universidad Nacional Autónoma de México (UNAM), com pós-Doutoramento na Universidade de São Paulo (USP). É professor aposentado pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Atualmente preside o Instituto do Trabalho Dante Pellacani

* Sinopse do livro Ascensão e Queda do Império Americano. São Paulo: Ed. CPC/Mandacaru, 2000. Texto apresentado no I Symposium sobre Globalização, promovido pela Casa da Sabedoria, em Bagdá, abril de 2002.

Recreio literário

O teatro e o cinema

Dilma Mello

Se você pensa que ir ao teatro é caro, tente o cinema…

O domingo estava claro e bonito, um daqueles dias de sol depois de um longo e tenebroso inverno. Havia passado as férias em casa me escondendo do frio debaixo de duas calças de malha, uma camiseta de mangas curtas, outra de mangas longas, um suéter de lã e duas meias, tudo isso somado a um edredom e um cobertor de pelinhos azuis. Aproveitei, então, para tirar toda aquela roupa que já estava um nojo e tomar aquele banho gostoso.

Depois do banho, já me sentindo um cidadão respeitável, comecei a pensar qual seria o meu programa de domingo. Primeiro, pensei em ir ao teatro e fiquei até muito contente com a idéia, pois ir ao teatro traz um certo ar de intelectualidade que todo mundo gosta de ter, e além do mais, depois de todo o aparato da “era da informação”, em que as pessoas preferem ficar diante das telinhas e dos teclados, ir ao teatro significaria um grande feito. Além disso, me senti um salvador da pátria, um patrulheiro ecológico ajudando a classe dos artistas que tão bravamente luta para conquistar espaço e patrocínio para a apresentação de suas peças.

Porém, ao consultar o jornal e a minha carteira, percebi que apesar de toda minha veia intelectual e ecológica ia ficar caro pagar meio salário mínimo para um só dia de diversão, já que minha filha havia decidido me acompanhar. Um quarto de salário mínimo para cada um, depois teria a condução, o estacionamento… Ir ao teatro de repente passou a ser um ato burguês e vergonhoso, pois enquanto a maioria da população brasileira ganha quatro a cinco entradas de teatro por mês, os quais segundo os nossos governantes dá perfeitamente para comer, ir ao médico, estudar e ainda se divertir, como poderia eu, um simples professor pensar em ir ao teatro.

Meio envergonhado, fui para a coluna dos filmes. O que fazer se a telinha é mais barata! Mas, aproveitando o fato de que nós brasileiros não temos vergonha mesmo, esqueci logo do rompante heróico de salvar o teatro e decidi ir ao cinema.

No meio do caminho começamos a pensar em qual cinema iríamos. Pensa dali e daqui e levando em conta o problema de estacionamento, decidimos ir ao shopping center. Escolhemos um daqueles com dez salas de projeção, assim teríamos outras opções que não aquelas destinadas às crianças já que estávamos em mês de férias escolares. O shopping escolhido ficava em um bairro de classe A o que me causava um certo receio, já que tudo costuma ser mais caro. No entanto, como nunca havia ido lá topei a empreitada.

Chegamos, e após girar quase que infinitamente a procura de uma vaga, estacionamos e subimos até o piso dos cinemas. Como esperado, vários filmes destinados ao público infantil, alguns destinados aos matadores de plantão e lá, bem no cantinho um filme francês. Ah, poderia enfim manter um pouco daquela veia intelectual abandonada em casa. Um filminho francês salvaria tudo. Porém, o filme só começaria quase três horas depois de nossa chegada, aí é que começou a minha via crucis.

Compramos os ingressos e decidimos dar uma “voltinha” pelo shopping. Como eu temia, o local era daqueles dedicado ao luxo e à extorsão de seus “clientes”. Bonito, sim, mas com escadas para todos os lados que te deixam como um louco rodando em círculos. De um lado a escada é só para descer, do outro só para subir, mas se precisar da escada rolante tem de ir para o outro lado, se quiser o elevador, ande mais algumas lojas, bla, bla, bla. Eficiente, sim, com aquela maquininha de primeira geração que te diz: você está no piso amarelo, suba até o piso azul, ande pela listra verde com bolinhas brancas, vire o rosto para esquerda e a seta indicará a loja de sua preferência.

De repente, entre um círculo e outro uma loja de CD´s com uma promoção imperdível! Não resisti a tentação burguesa e comprei dois que traziam shows antigos da MPB. Mas eu tinha minha razão pessoal e relevante, a oportunidade de ouvir as músicas daqueles discos de vinil que eu havia emprestado e nunca haviam me devolvido.

Depois de gastarmos quase a metade de um salário mínimo entre os tickets e os cd’s, decidimos comer alguma coisa antes que o filme iniciasse. Fomos, então, para a praça de alimentação. Lá, após girarmos como um pião novamente, pois as lojas ficam em um círculo, nos deparamos com um espetáculo gastronômico que fez com que nossa gula despertasse de forma bem selvagem. Era um tal de pessoas comendo deliciosas batatas, lindíssimas lasanhas, polpetones e molhos vermelhíssimos gritando para que os pedíssemos. Era impossível resistir. Eu até que tentei quando dei uma olhada nas tabelas de preços, mas minha filha já estava olhando para mim com cara de canibal. Lembrou que não tinha almoçado, falou que só havia feito um lanchinho, de repente lembrou que estava com dor de cabeça de tanta fome… Rendi-me. Um dinheirinho a mais não ia fazer tanta diferença, afinal férias! Manda uma porção de nhoc, que ela foi logo avisando que comeria sozinha, apesar da minha tentativa frustrada de pedir um só prato para nós dois. Eu, para não ficar olhando, pedi um polpetone que era o prato mais barato.

Depois de tanto comer e gastar, decidi ir direto para a sala de projeção, antes que alguma outra promoção viesse a nos tentar. Ledo engano! Lá chegando, outra tentação: o cheiro da pipoca perfumava o local e era quase impossível não querer. Mas quase caí duro ao ver a tabela de preços da lanchonete ou snack bar, como preferir. Apesar da promoção coloridamente exposta, uma pipoca pequena custava 5% do salário mínimo, a mais cara custava quase 10% do mesmo. Um refrigerante então, nem pensar! Decidi comprar apenas uma água para beber durante o filme. Mas, minha filha retrucou dizendo que eu já havia gasto tanto, por que economizar um ou dois reais, que diferença isto faria? Afinal, estamos nas férias!

Apesar de querer comprar o copo de refrigerantes infantil, minha filha convenceu-me a comprar o pequeno que para meu espanto vinha quase um litro de refrigerante. Entramos em mais uma fila e vinte minutos depois estávamos em uma sala claustrofóbica, diante de uma tela que devido ao tamanho da sala mais parecia um outdoor. Para entrar e sentar, somente uma pista entre as duas fileiras de poltronas. Como sairíamos dali caso acontecesse algo. E se um outro matador louco resolvesse agir? (Refiro-me àquele homem que entrou em uma sala de cinema e metralhou várias pessoas, lembram?) Minha filha tentava me acalmar, afinal eram férias e um possível matador deveria estar de férias também.

O filme começou e passamos quase três horas naquela sala minúscula e claustrofóbica ouvindo um som irritante de uma porta dessas que fazem barulho quando a gente entra em algumas lojas, tlilimlimlimlim, pois no filme havia uma porta dessas. E a minha última esperança de ter um domingo intelectual acabou entre aquele som irritante e uma historinha açucarada muito parecida com as nossas novelinhas de todos os dias. É, tudo bem. Pelo menos é bom saber que eles também sabem fazer porcarias.

Saímos e fomos direto para o piso em que teríamos de pagar pelo estacionamento. Outra grande fila nos aguardava. E, quando o gentil cavalheiro disse que tínhamos de pagar quase 10% do salário mínimo, tive que rir de mim mesmo. Senti-me um perfeito idiota brasileiro tentando viver como os enlatados padrões do primeiro mundo. Saí do meu regime, gastei uma fortuna, me aborreci com as escadas, as filas… Bem feito, o teatro só me teria custado a metade do salário mínimo.

O Mendigo
Raimundo Ferreira de Vasconcelos

Sentado à beira do caminho e
cercado pela escuridão, que vejo eu ali?
Pernas cruzadas, olhos vedados e mão estendida
_ Uma esmola para um pobre cego!

Pedestres passavam, alguns nem olhavam para o velho mendigo
Suas fétidas chagas onde moscas paravam e pediam abrigo
Pobre mendigo! pobre mendigo!
Exilado do dia…da noite cativo…

Queria cantar, já não tinha mais forças
Queria chorar, já não havia mais lágrimas
Queria fugir e lhe faltava coragem

Mas fugir para onde? Para outra vida…e enquanto o momento não chegava
O mendigo ali continuava; pernas cruzadas, olhos vedados e mão estendida
_ Uma esmola para um pobre cego!

Informe publicitário

Relações internacionais amplia vagas

O Centro Universitário Belas Artes de São Paulo ampliará o número de vagas oferecidas no curso de relações internacionais, bem como, o de outros cursos já ofertados por essa Instituição de Ensino Superior (IES), já no próximo semestre letivo (2003/2).

Haverá cinqüenta novas vagas ofertadas no período matutino, visando atender à demanda reprimida há muito existente. Confira no quadro abaixo o número de vagas autorizadas em seus respectivos cursos e horários de funcionamento.

C U R S O S
Vagas autorizadas
Total
Manhã
Noite
Relações Internacionais
50
50
100
Administração de Empresas
50
50
100
Comunicação social
50
50
100
Design de Moda
50
50
100
Turismo
50
50
100
*Bacharelado em artes visuais
100
50
150
Pedagogia
50
50
100
TOTAL PARCIAL
750

Fontes: Pró-Reitorias Administrativa e Acadêmica / FEBASP.
*. Oferecido nos períodos da manhã, tarde e noite (50 vagas cada).

Os demais cursos, e.g., Arquitetura e Urbanismo, Desenho Industrial, Artes Visuais etc., continuarão oferecendo suas vagas habituais e nos respectivos turnos de funcionamento de sempre.

VESTIBULARES

Processo seletivo

No próximo mês de abril/03, estarão abertas as inscrições para o processo seletivo, de candidatos aos cursos de graduação do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, localizado no bairro paulistano da Vila Mariana.

Os interessados também poderão se inscrever pela Internet. Para tanto, deverão preencher a ficha de inscrição que se encontra disponível on line no sitio do referido Centro Universitário: www.belasartes.br

Nosso processo seletivo mantém-se contínuo, perfazendo três modalidades: entrevista, vestibular tradicional e transferência de outras IES.

Especificamente para o curso de relações internacionais, exige-se exames de língua estrangeira, inglês e espanhol, cujos testes constarão de textos a serem traduzidos e/ou interpretados, sendo permitido o uso de dicionários.

Nossa expectativa é de que o número de candidatos para R.I. supere mais uma vez o total de vagas ofertadas, a exemplo do que ocorreu no processo seletivo anterior.

Seja um acadêmico de sucesso
Torne-se um profissional respeitado
Venha dialogar com o mundo e
Seja diferente
Faça R.I. na Belas Artes

Expediente

Ficha técnica

Edição e revisão técnica:
Prof. Dr. Raimundo F. de Vasconcelos
Revisão de texto: Sr. João de Oliveira
Web Design: Fabiano Reis
Fabio Espíndola
Design Gráfico: Adriano Frachetta
Colaboradores permanentes: Professores e alunos do curso de relações internacionais

Revista on-line do Curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo.